Produção de cutelarias na Herdmar | ||||
Por Maria Teresa Portal Oliveira (Professora), em 2012/06/08 | 2116 leram | 0 comentários | 227 gostam | |||
Em maio, numa segunda visita à Herdmar, nossa coparceira no projeto “Cutelarias e Cutileiros-na senda do património material e imaterial”, houve a preocupação de recolher toda a informação sobre o processo de produção de talheres, | ||||
quais os tipos de aço utilizados, os avanços na serralharia, na reparação e feitura de novas ferramentas que acabariam por introduzir novos processos de produção das cutelarias, aumentando a produção e baixando o custo para melhor enfrentar a concorrência nos mercados internacionais. O coração de uma fábrica de cutelarias é uma boa serralharia em funcionamento, pois dá respostas à criatividade necessária para desenvolver a empresa no comércio externo, criando constantemente novos modelos de talheres para dar resposta à exigência dos mercados que variam de país para país de acordo com os hábitos e a cultura de cada um. A serralharia começou por ser toda feita manualmente, visto as matrizes dos cortantes serem abertas a furo nas máquinas de furar, tendo de se devastar até à medida do molde manualmente à lima. O punção era devastado no limador mecânico, fazendo aproximação ao molde, embora o acerto final fosse à lima também. Mas a maior dificuldade na altura era temperar as ferramentas, visto o forno ser muito rudimentar, sendo a temperatura vista a olho nu, com uma tabela das cores correspondentes aos graus de temperaturas, não havendo um pirómetro para medir a temperatura nem máquina de medir durezas. Por vezes, como o calor não era uniforme, o aço ganhava tenções, pois as matrizes desenformavam-se muito e a dureza não ficava uniforme e assim não se tirava o melhor rendimento das ferramentas. Hoje, já não é assim. As ferramentas começam-se e acabam-se sem ser necessário pegar em limas e martelos. Tudo é feito em máquinas de alta tecnologia desde o desenho do modelo em AUTO-CAD, que, com um programa transversor, transporta os dados do desenho ao computador da máquina de fio por eletroerosão, que acerta o punção e matriz dando-lhe a devida folga de corte consoante a espessura da chapa que é necessário cortar, ficando a ferramenta pronta. Para temperar as ferramentas, hoje existe um forno com um autómato em que se metem os dados da temperatura que tem de atingir a ferramenta, e, quando isso acontece, o pirómetro ligado ao autómato desliga-o, esperando-se uma ou duas horas consoante as dimensões da ferramenta, para uniformizar a temperatura por toda, mergulhando-se de seguida no óleo. Passámos por todos os setores da laboração, desde o começo do fabrico (cortar, laminar, aparar, estampar/ramiar) até à parte final (brunir a lixa, brunir a massa, polir) e, no caso das facas, ainda amolar e serrilhar. Antes da entrada de dois balancés de corte e de algumas ferramentas, as colheres e os garfos eram feitas de aço inoxidável em barra forjadas a quente, trabalho duro e pouco rentável que deixava as peças com as superfícies irregulares, tornando-se impossível o seu acabamento nas máquinas de polir e obrigando a que fossem polidas manualmente. Por volta de 1963, começou o fabrico a utilizar chapa de aço inoxidável tipo 430, cuja composição química contem 16 a 19% de crómio, que é o elemento mais importante nos aços inoxidáveis, aumentando a sua resistência à corrosão e, através de polimento, ganhando grande brilho. Também passou a ser utilizada a chapa de aço inoxidável tipo 304, cuja composição contém 17 a 19% de crómio e 8 a 12% de níquel, que, com este elemento, aumenta a sua resistência à corrosão, mesmo em meios francamente oxidantes. Tem grande resistência mecânica, amoldando-se muito bem em situações de talheres ou louças de grande dificuldade de estampagem, melhorando também em relação ao brilho, que se obtem com mais facilidade. Geralmente, a este tipo de chapa, dá-se o nome de chapa de 18-8 ou 18-10, consoante o valor do níquel. As cutelarias utilizam ainda um outro tipo de aço, o aço em barra, tipo 420, cuja composição química contém 12 a 16% de crómio e 0,10 a 0,40% de carbono, que é o elemento que lhe dá resistência ao choque e à elasticidade endurecendo, através do tratamento que se faz (tempera e revenido). Geralmente, é aplicado no fabrico das facas cuja dureza é necessária para se obter bom corte e duradouro. No fabrico das facas, houve também um avanço muito grande no processo de produção com o aparecimento de mais balancés de corte, prensas de estampar e máquinas de polir. Por exemplo, nas facas de cabo monobloco, que até aí eram estampadas a quente, ficando num estado de acabamento que tinha muita mão-de-obra nas operações seguintes, a partir daí começou a estampar-se as facas a frio, aumentando a produção para o triplo, e ficando em melhores condições de acabamento. Como o aço era polido antes, com as estampas de aços especiais de estampar a frio bem polidas, o cabo ficava fácil de polir, conseguindo eliminar-se muita mão-de-obra e baixando-se muito os custos de produção, contribuindo para que a empresa melhor enfrentasse a concorrência e conquistasse novos mercados internacionais. O polimento é uma operação que se faz nos aços oxidáveis por fricção com um polidor de sisal com pano de algodão (com a rotação do veio entre 900 e 1400 rpm, consoante o diâmetro do polidor)e adicionando pasta de polir para as peças ganharem brilho. O Facho e o Flecha são dois dos primeiros modelos de talheres feitos na empresa pelo senhor Daniel Freitas, que ainda hoje são comercializáveis. Os cortantes e as estampas com a gravação do desenho foram feitos por ele. Depois de vários estudos no sistema de corte, conseguiu fazer-se um aproveitamento da matéria-prima, principalmente no tipo das colheres não laminadas, visto o sistema dar muito desperdício, devido à fisionomia da colher, com a concha muito mais larga do que o cabo, conseguindo-se um aproveitamento de 20 a 25% na matéria-prima, com a vantagem de se poder introduzir o sistema de bobines e a automatização do sistema de corte, o que veio aumentar a produção para o triplo, além de economizar a matéria prima. Investir na formação das chefias, na modernização e aposta na automatização, na criação de trabalhadores polivalentes para que as máquinas não parem e não haja tempos perdidos, no apuramento do custo por peça através do apuro do custo/hora de cada trabalhador e no acompanhamento da obra ao longo do percurso de fabrico nas várias operações… foram alguns dos pontos fulcrais para o desenvolvimento da Herdmar. A produção chegou a passar os 16.000.000 de peças ano, o que equivale a 1.400.000 peças mês, na década de 90. Hoje, esses números baixaram, mas a capacidade da empresa continua intacta em meios tecnológicos. Agradecemos ao senhor Domingos Maia que nos acompanhou na visita, dando todos os esclarecimentos, e ao senhor Daniel Freitas que nos forneceu alguns escritos explicativos. Sá assim o trabalho pôde ser feito. | ||||
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